Em entrevista concedida à Heloísa Noronha Do UOL, em São Paulo, falamos sobre “amizade colorida”.
05/2014. Getty Images.
Nos anos 70, ainda impregnadas pelo perfume hippie da década anterior, as pessoas se dispunham a experimentar diversas formas de se relacionar. Com isso, a gíria “amizade colorida” entrou na moda para se referir aos amigos que transavam estabelecer qualquer vínculo mais sério. O termo usado na época soa um tanto antiquado para os dias atuais, no entanto, fazer sexo com um amigo é algo cada vez mais comum – e aprovado por especialistas, que vêem benefícios na prática.
“Trata-se de uma oportunidade de ter alguém de confiança para trocar carinhos e desfrutar momentos de intimidade mesmo não estando namorando”, comenta Juliana Bonetti Simão, psicóloga especializada em sexualidade, de São Paulo (SP).
“Muitos homens e mulheres que viveram a experiência de uma ‘amizade colorida’ continuam a ser amigos, mesmo depois que o sexo acabou. Tudo vai depender de como cada um experimentou essa vivência. Há, inclusive, quem aprenda a se relacionar melhor em relacionamentos futuros”, diz a sexóloga Carmen Janssen, de Vinhedo (SP), membro da Sociedade Brasileira de Estudos em Sexualidade Humana (SBRASH).
Porém, assim como acontece em qualquer relação afetiva, o sexo entre amigos também precisa ser orientado por algumas regras que devem ser previamente combinadas pelos dois. O primeiro fundamento é que cada um saiba muito bem o que esperar desse tipo de arranjo.
“Ambos devem encarar a situação com maturidade, serem sinceros sobre suas reais intenções para não criar expectativas”, fala Carmen. “Algumas pessoas, geralmente as mulheres, não conseguem separar sexo de amor e aceitam a situação porque têm esperança de a relação se tornar mais séria. E, quando isso não acontece, elas acabam se frustrando”, completa a especialista.
De acordo com Juliana, questões sobre fidelidade e lealdade devem ser discutidas para que nenhuma atitude das partes machuque o outro e ponha fim à amizade. É óbvio, entretanto, que os acordos podem se desviar do caminho.
“Os dois devem ter em mente que há grandes chances de alguém acabar se envolvendo afetivamente e a outra parte não. Há possibilidade ainda de as emoções se confundirem e a amizade acabar”, declara a psicóloga.
Na opinião da psicóloga e sexóloga Jussania Oliveira, de Americana (SP), o “contrato” deve ser firmado de comum acordo, com as regras bem definidas para evitar mágoas e ressentimentos.
“Se ambos estão disponíveis, sentem atração sexual e aceitam a possibilidade de ficarem juntos sexualmente na boa, ok. Mas devem estar atentos quando uma ou mais regras forem quebradas, quando um ou outro começa a apresentar comportamento de posse, ciúmes ou exige satisfação e comprometimento. Isso precisa ser sinalizado para que reavaliem a continuação ou não dos encontros sexuais”, explica.
Segundo Ricardo Desidério, sexólogo e psicoterapeuta de Londrina (PR), não se trata de um passatempo, um jogo, por mais descompromissada que a relação pareça.
“Mesmo sem quaisquer intenções, não estamos lidando com um simples objeto e sim com sensações, desejos, sejam eles ocultos ou não. O sexo casual pode desencadear uma bela história de amor, mas também pode acontecer uma única vez e mesmo assim abalar a relação de amizade”, afirma.
Para preservar a amizade, o ideal é apostar na sinceridade desde o início. Não existe uma receita mágica que sirva para todo mundo nem garantias, mas viver é fazer escolhas. Ambos devem lembrar que sexo sem compromisso implica na possibilidade de ambos encontrarem outros relacionamentos e também de um se apaixonar pelo outro.
“Quem fica com a consciência pesada é sinal de que não estava preparado para ter quaisquer intimidades com o amigo. Por isso, nesse tipo de relacionamento é preciso ter uma visão muito aberta sobre a situação. Acredito que muitos não estão preparados”, fala Desidério.
Quando um dos dois se interessa verdadeiramente por outra pessoa, é essencial abrir o jogo e se colocar perante essa nova situação, definindo como acabar a “amizade colorida”. Sob essas circunstâncias, há um dilema: contar ou não ao parceiro que transava com o amigo?
“Não acredito ser producente revelar, uma vez que a convivência irá continuar e isso poderá constranger ou gerar ciúmes e desconfiança. Partilhar histórias e experiências anteriores, muitas vezes com riqueza de detalhes, não irá agregar absolutamente nada, correndo o risco de comprometer e influenciar negativamente esse novo relacionamento”, diz Jussania.
“O novo amor pode não entender a situação e, eventualmente, contar tudo prejudicaria sua relação de amizade. O que aconteceu com você antes de conhecer seu parceiro fixo, quem você namorou ou ficou é algo pertencente a sua particularidade. O que realmente importa é o que vocês construirão juntos”, fala Desidério.